terça-feira, 29 de junho de 2010

A DIVINA COMÉDIA DE DANTE




O chuveiro hoje me parece o lugar mais seguro, quando a água quente cai sob a cabeça, que queima o cabelo, escore pelos olhos e obriga-me a manter-los fechados, nesse momento sou consumido por uma espécie de transe, envolvido pela água escaldante, como Dante de Alighieri a caminhar pelo inferno sozinho, perdido e de alma cansada, para vencer os nove círculos.


O amor, pra quem nunca teve, parece algo ridículo, para os que amam surge em certos momentos à estúpida necessidade de colocá-lo a prova. O amor não é palpável, mas existe como as incansáveis flores que insistem em levar uma única gota de orvalho da beleza, para onde não existe nada.

"Eu deixarei que morra em mim o desejo de amar os teus olhos que são doces,
Porque nada te poderei dar senão a mágoa de me veres eternamente exausto.
No entanto a tua presença é qualquer coisa como a luz e a vida e eu sinto que em meu gesto existe o teu gesto e em minha voz a tua voz. Não te quero ter porque em meu ser tudo estaria terminado.
Quero só que surjas em mim como a fé nos desesperados para que eu possa levar uma gota de orvalho nesta terra amaldiçoada que ficou sobre a minha carne como nódoa do passado.
Eu deixarei...
Tu irás e encostarás a tua face em outra face.
Teus dedos enlaçarão outros dedos e tu desabrocharás para a madrugada.
Mas tu não saberás que quem te colheu fui eu, porque eu fui o grande íntimo da noite.
Porque eu encostei minha face na face da noite e ouvi a tua fala amorosa.
Porque meus dedos enlaçaram os dedos da névoa suspensos no espaço.
E eu trouxe até mim a misteriosa essência do teu abandono desordenado.
Eu ficarei só como os veleiros nos pontos silenciosos.
Mas eu te possuirei como ninguém porque poderei partir.
E todas as lamentações do mar, do vento, do céu, das aves, das estrelas.
Serão a tua voz presente, a tua voz ausente, a tua voz serenizada''.

domingo, 6 de junho de 2010

SÓ EU

Caminho sozinho e preparo a terra para receber as roseiras vermelhas, e as amarelas também. Enquanto na tempestade que são meus pensamentos, locomovo-me sem dificuldade alguma, só entristeço quando olho pra traz e vejo os que congelaram ao tentar me acompanhar.



O Jardim estava em rosa ao por do Sol
Deixando por tudo uma presença de água
Tudo limpo que nem toada de flauta
A gente se quisesse beijava o chão sem formiga
A boca roçava mesmo na paisagem de cristal
As sombras se agarravam nos folhedos das arvores.
Tinhas um sossego tão antigo no jardim
Uma fresta tão de mão lavada com limão
Que desejei
Mulher não desejei não
Desejei, se eu tivesse ao meu lado ai passeando
Suponhamos... Lênin, Carlos Prestes, Ghandi, um desses.
Na doçura da manhã quase acabada.
Eu lhes falava cordialmente, se abanque um mucadinho.
Coisa assim
Que colocasse um disfarce de festa nos pensamentos dessas tempestades de homens.